Friday, August 22, 2008

Tempo.

Com a serenidade e ternura das mulheres velhas que tudo sabem, passou a mão pelos cabelos cinzentos que o tempo lhe dera. Respirou fundo, alisou a camisa branca e ajeitou a saia. Sentou-se no cadeirão. Fazia anos que não se sentava ao lado dele, sempre lhe incomodara o cheiro dos charutos cubanos. Respirou outra vez, mas devagarinho, como quem tem medo de roubar o ar dos outros, para não o incomodar com a sua presença. Sem saber como, começou a admirar aquele homem que tantos anos compartiu a seu lado.

Viu nele cada ruga, cada cicatriz e cada mancha que o tempo escreveu no seu rosto. Ali sentado á contraluz, quase parecia um daqueles gentlemans que o tempo se nega a fabricar nos dias de hoje. O chapéu negro na cabeça, as calças imaculadamente vincadas, a bengala de marfim e aquela barba branca, davam-lhe características únicas que, se não existissem, já nada teria sentido.

Percebeu o carinho que lhe guardava, entendeu cada sacrifício que por ele tinha feito e constatou, uma vez mais, que o amava, mesmo depois dos cinquenta anos que por aqueles rostos (outrora belos) tinham passado.

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